Ronaldo Basílio e uma das grandes brigas do meio n
Não chega a ser má vontade. Mas, sim, desconhecimento técnico que geralmente vem em resposta a abusos em projetos barra-pesada. Essa é a opinião de Ronaldo Basílio, diretor da Squalo Marinas. Ele se autodenomina "fã da questão do meio-ambiente" e dá de ombros para a polêmica envolvendo os empresários e as entidades de preservação da natureza. Segundo Basílio, o que existe em meio a essa briga para a construção de marinas é um radicalismo de ambas as partes que não se reflete num cenário em que 70% dos projetos verdadeiramente comprometidos conseguem ser tocados adiantes. "Se feito dentro da legislação, as chances são muito pequenas", resume em entrevista ao Portal Náutico.
Portal Náutico: O que leva alguns projetos de marinas a ficarem pelo caminho?
Ronaldo Basílio: Como eu posso te dizer isso? Alguns projetos morrem ainda na fase de projeto porque o empresário resolveu dar outra destinação à área, decidiu não tocar mais aquilo ou simplesmente espera e não está com o dinheiro. Esses são projetos que nascem e morrem naquela ideia. Os projetos que os empresários resolvem ir à luta e investir praticamente 70% foram para frente.
Na verdade, as questões são duas: por que eles foram para frente e por que eles não foram para frente. A primeira questão é que, hoje em dia, depois de apanhar tanto, a gente faz um projeto ambientalmente sustentável, dentro da legislação ambiental, numa área que dá para aprovar. Dentro dos conceitos modernos de marina ambientalmente sustentável. A gente não faz projeto com forçação de barra. Por exemplo, tem uma praia e nós vamos fazer um aterro sob a praia? Não fazemos isso.
Portal Náutico: E se o cliente insistir, como proceder nesses casos?
Ronaldo: A gente avisa o proprietário, não adianta recorrer a influências, estamos fora, não vai ser aprovado. Na Squalo, a nossa experiência é muito calcada em cima desses projetos. Às vezes, o empresário quer fazer um projeto muito grande, mostramos para ele que é necessário diminuir o projeto, usar uma outra solução tecnológica para resolver o problema dele para que seja aprovado. Esse é o primeiro tema. A marina já sai quase com o selo garantido de aprovação. Depois, tem uma outra questão que são os prazos. Tem marina que a gente consegue aprovar com um ano, um ano e meio e tem marinas que demoram cinco anos. Depende do local, da dificuldade ambiental, do órgão ambiental que vai analisar, da quantidade de dinheiro que o empresário está disposto a investir. Enfim, todo o estudo, se você tem esse dinheiro para fazer em três meses, você consegue aprovar em um ano, um ano e meio. Agora se ele diz: "Não, é muito cara essa aprovação, vamos fazer devagar". Acaba aprovando, mas em três, quatro anos.
Portal Náutico: Dentro desse prazo, ainda acontece de o proprietário não seguir com o projeto?
Ronaldo: Muitas vezes, ele desiste no meio do caminho porque vai tratar de outro assunto. Outras, o projeto é de concessão em área pública e o empresário tem aquele compromisso e depois ele perde aquela concessão porque não seguiu aquele compromisso. Mas se o cara é dono da terra, quer fazer o projeto, a área tem uma condição ambiental propícia - não tem nenhuma restrição, um bicho ameaçado de extinção, um ecossistema puro -, se não tem um ecossistema que impede, as condições são muito boas. Não tem muito mistério, não. Aliás, eu sou fã dessa questão do meio ambiente. Nunca praticamente tivemos um projeto que levamos até o final e que não tenha sido liberado.
Portal Náutico: Como você avalia, então, o risco de um projeto esbarrar em questões ambientais?
Ronaldo: É um risco muito pequeno. Se feito dentro da legislação, com os conceitos e os cuidados, respeitando os prazos e num tamanho sustentável, os riscos são realmente pequenos. Agora você não pode querer colocar Rio de Janeiro dentro de Niterói, não vai ser aprovado. Por outro lado, uma coisa dentro da escala, respeitando as condições ambientais e com todos os meios de proteção, a gente fez diversas marinas. Temos o caso emblemático da Marina Meliá Angra, uma marina situada na praia, num manguezal e num costão. Ou seja, os três ecossistemas mais protegidos pela legislação brasileira. Essa marina foi construída, está operando e teve no ano passado a maior certificação ambiental do mundo, a "blue flag". Foi a primeira marina em toda a América Latina a obter essa certificação. Agora, se você me perguntar: quanto tempo foi para aprovar? Quase oito anos. Ou talvez até um pouco mais que isso. Mas a marina está funcionando, todo mundo satisfeito, os proprietários e clientes felizes. Um caso de sucesso.
Portal Náutico: Dá para dizer que falta um pouco de diálogo nessa discussão?
Ronaldo: Eu acho que existe um pouco de desconhecimento técnico por parte das entidades e órgãos. Mas existem também abusos de empresários que fazem projetos barra-pesada. Eu acho que existe desvio dos dois lados. É isso que a gente aprendeu: fazer uma coisa que seja ambientalmente sustentável e financeiramente sustentável. Não adianta fazer um santuário ecológico que não dê resultado, não vá trazer lucro. A verdade é essa: existe uma interpretação da lei muito xiita em alguns casos, mas baseado principalmente no radicalismo de alguns projetos que criam esse impasse. É uma coisa dos dois lados.
Portal Náutico: A demanda de marinas supera a oferta atual?
Ronaldo: Eu acho que as marinas estão acompanhando esse crescimento da indústria náutica brasileira. Não vou dizer que todas elas vão ficar 100% cheias, mas as marinas estão saindo e a indústria náutica está produzindo os barcos. Não sei se vai faltar marina ou vai faltar barco. Não sei dizer isso. Acho que está equilibrado.
Portal Náutico: Uma crítica que costuma ser ouvida é em relação ao apoio do governo. Falta maior incentivo da parte dele?
Ronaldo: Existe muito chororô. Não passa de chororô, o governo apoia. E no que é que o governo apoia? O governo dá dinheiro para financiar. Agora quer que o governo passe? Não vai fazer. Tudo isso não passa de choro para mim, sobretudo de cara que fica colocando a culpa no governo porque não tem competência para fazer. Quem quer fazer, faz, contrata bons profissionais, faz bons projetos e depois vai para o governo e diz: "Governo, estou precisando de dinheiro. Aqui é o meu projeto". O governo põe perfeitamente, "vamos te emprestar". Então, talvez o governo pudesse ajudar um pouco mais na liberação das licenças, acelerar o licenciamento, mas não vejo isso como uma atenção especial para as marinas. O licenciamento ambiental do governo como um todo é complicado. Basta ver Belmonte, um projeto prioritário que o governo está apoiando, ainda tem a transposição do Rio São Francisco que levou porrada durante anos. Fato é que a máquina do governo para aprovar os projetos de desenvolvimento ainda não é uma máquina moderna, mas não tem nada a ver com marina. Marina é uma, existem "n" outras situações. A indústria portuária leva porrada para aprovar, o próprio governo apanha do governo, é uma discussão que eu não entendo. Eu vejo que o viés desenvolvimentista do governo não tem muito apoio do viés ambiental do governo, ele pisa muito no freio. No caso específico de marina, essa dificuldade é a mesma, agora o governo, enquanto fomentador da indústria, mais do que emprestar dinheiro a juros muito interessantes, não existe. Esse papel está bem organizado.