Um pedaço das Bermudas
O site que defende o projeto de lei (http://www.alcatrazes.org.br) existe desde 2000 e acumula mais de 2 bilhões de acessos. Pode parecer muito, e é. Mas nada comparado ao tempo que este projeto já circula na pauta dos políticos: aproximadamente três décadas. No último dia 30 de março, no entanto, foi dado um passo decisivo para que o Arquipélago de Alcatrazes seja submetido a uma mudança de categoria que o elevaria de Estação Ecológica Tupinambás para Parque Nacional dos Alcatrazes.
A recategorização há tanto tempo sonhada contou com 430 assinaturas e o apoio de 90% dos participantes que compareceram ao Teatro Municipal de São Sebastião, localizado na cidade de mesmo nome, no Litoral de São Paulo. O processo ainda irá passar pelo Congresso e, se aprovado, fará do arquipélago o terceiro parque marinho do Brasil e o primeiro da região Sudeste - os outros são Fernando de Noronha e Abrolhos, ambos situados no Nordeste.
A inspiração para o Parque, inclusive, deverá vir de Noronha, com permissão para o mergulho contemplativo e fundeio de barcos - entre as décadas de 80 e 90, foram formados 3.500 mergulhadores por lá, enquanto que a navegação e a ancoragem no local eram autorizadas. A volta da pesca esportiva, um desejo antigo de seus praticantes, ainda se encontra em discussão.
Boa parte do debate em torno desses três pontos reside sobre a utilização de Alcatrazes pela Marinha como local oficial de treino de tiro desde 1982. Realizada cerca de dez vezes ao ano, com uma média de até 4 mil disparos, a atividade provoca polêmica e já foi alvo de ações judiciais após incidentes como o que destruiu parte da ilha em 2004. Os treinamentos deverão seguir, com a Marinha já tendo acordado, segundo fontes, a manutenção da área do Saco do Funil, trecho localizado na parte Nordeste e que possui uma declividade de 70%.
Essa é uma realidade que se repete ao longo de toda a região, com morros rochosos, encostas íngremes e a consequente escassez de praias. Mas se por um lado as características do arquipélago funcionam como uma barreira de proteção para a sua fauna - em seus 12 mil hectares, afirmam estar concentrada a maior colônia de aves marinhas em ilhas do Sudeste -, por outro agem também como um convite sedutor para um produto turístico peculiar, que terá nas embarcações particulares um meio de preservação.
É o que defendem as autoridades ao sustentar o discurso de que o segmento náutico será o maior responsável, seja com as marinas locais, seja com barcos ou lanchas, pelo controle de visitação do Parque e a divulgação de suas normas. Localizado a 45 km do Porto de São Sebastião, o arquipélago formado por cinco ilhas irá usufruir, com a nova classificação, de uma política que possibilitará, dentre outras coisas, a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental.
Considerado ao lado de São Sebastião e Ilha Bela como o "Triângulo das Bermudas" brasileiro no passado, o Arquipélago de Alcatrazes pode voltar a se aproximar das pessoas. Um processo de ruptura que já vinha se prolongando há algo como 11 mil anos, quando o nível dos oceanos subiu ao fim da última glaciação - e que pode trazer na esteira de sua caminhada no Congresso o Parque da Queimada Grande, no Litoral de São Paulo, que também pleiteia a sua recategorização.